Ontem, depois que vi o Profissão Repórter, fiz uma breve reflexão e fiquei pasma com a conclusão que cheguei. Do alto da nossa comodidade inatingível, sentados em nossos sofás ou debatendo os assuntos sociais no café-da-manhã, falamos, falamos e não sabemos o que falamos, pra ser bem sincera! Não digo nem que falamos sem saber; falamos sem procurar saber. Pode parecer a mesma coisa, mas garanto que é bem diferente!
Diariamente, pois eu mesma fiz muito isso, reclamamos dos moradores de rua que viviam em torno da favela de Manguinhos/RJ. Ontem, foi feita uma operação da Prefeitura da Cidade para retirar menores usuários de drogas das ruas e levá-los a um abrigo para tratamento e tentar uma cura para esse vício degradante, que é o uso de drogas. A gente só recrimina uma classe que julgamos querer estar nesse estado de pobreza, descrença, sem nada a perder. Criticamos a policia que não faz nada, os traficantes que se aproveitam dessas vítimas, das pessoas fracas que caem nessa vida, a sociedade que se torna impotente diante de uma praga que a devasta tal qual a uma plantação... enfim, tá tudo errado nessa bosta de situação! Mas e qual é o certo?
A gente, e quando digo isso me incluo, pois faço parte dessa massa que apenas fala mal pela situação que vê diante de seus olhos, mas que pouco procura saber o que acontece fora do alcance de nossas vistas. Há programas sociais decentes - que não são só fachadas para ganhar remuneração do governo que vai parar no bolso de algum (uns) funcionário (os). Programas esses que se não fosse a reportagem de ontem, ainda seriam desconhecidos para mim. E quem trabalha neles, faz porque gosta, faz porque acredita em algo que ninguém mais quer: na regeração humana! Ou, nem que seja para se dar conta de vez de que ela não acontece! Mas, ao menos, existem pessoas que saíram do comodismo e da conveniência de apenas falar e começou a agir. Pode não gerar muitos resultados imediatos, mas Jesus também não conseguiu uma multidão de discípulos da noite pro dia. É desgastante, triste e até mesmo cruel o estado que muitas destas crianças chegam a estes abrigos. Desesperados pela abstinência da droga, chegam até a ser agressivos com pessoas que tem que ter compreensão, paciência e tolerância ao extremo. Muitas vezes sem remuneração, só voluntariado mesmo. Sim, essas pessoas escolheram estar ali. Mas, assim como rebatemos dia após dia uma situação "imutável", podemos falar também e bem do que é feito para tentar melhorar um pouco as coisas. Tá longe de ser a solução, por favor, não me entendam mal! Mas, já é um começo!
Da raiva que sinto quando vejo aquele povo sem nada a fazer na vida, cheirando a torto e a direito, em plena luz do dia, cercados de crianças e adolescentes, passei a pena pela degradação do indivíduo onde muitas vezes essa vida não foi uma escolha, uma opção... foi o que restou! O que esperar de crianças que crescem com os pais viciados em álcool e drogas? E que a mãe está presa, o pai é bandido - quando se sabe quem é ou o paradeiro dele - ou quando não são abandonados pelos dois à própria sorte? Nada, né? Assim como eles... aprenderam a se virar. E viraram reprodutores de infrações da sociedade!
Abri meus olhos e meu coração para enxergar além do que meus olhos veem, e que meu senso crítico pode julgar de acordo com meus valores o que é certo ou errado. Essa linha tênue entre as duas palavras, para quem não tem nada, não existe. Não têm exemplos, não têm regras, não têm valores, nem sequer existem para nós. A verdade é essa: se fossem insetos, a gente os esmagava! Não tô dizendo que virei Madre Teresa, a defensora dos pobres, fracos e oprimidos. Sim, ainda sinto muita revolta quando vejo viciados de todos os tipos de drogas fazerem e acontecerem por causa delas. Tenho raiva de pensar que eles não pensam em ninguém e não medem esforços para conseguir o que querem: cheirar, fumar só mais um pouquinho. Quem já não teve vontade de exterminar esses seres da face da terra? Eu já! Mas, agora vejo além da minha revolta, o outro lado da moeda, aqueles que, por escolha própria ou não, tentam mudar de vida e voltar a viver! Não, não é fácil. Aliás, é mais difícil do que continuar na vida fácil. Vencer o preconceito, quebrar paradigmas, desconstruir uma imagem que o segue que nem sombra. Uma vez me disseram que ex é sempre ex: ex-namorado; ex-presidente; ex-jogador de futebol... mas para quem estava 'no erro' nunca é ex, é sempre atual. E quem vai dar o voto de confiança e acreditar que fulano mudou? Quem se arrisca?
Esse é o problema: falamos mal, mas também não ajudamos quando necessário. Se cada um de nós, que tivemos todas as oportunidades na vida, boa educação, família, valores pudéssemos passar algumas horas no mundo de quem tenta se recuperar, acredito que mais do que uma experiência de alteridade, seria uma lição de vida, acima de tudo de solidariedade! Só açoitar não adianta... tem que haver alguém que estenda a mão! Coisa que nós, não fazemos e quando fazemos é de má vontade ou com o pé atrás. Se não for sincero e com boas intenções também não funciona. Estamos sendo então, tão interesseiros quanto eles, só que eles são na cara dura, nós, dissimulamos em atitudes que esperamos retorno em prol do nosso bem estar. Há uma grande diferença entre fazer justiça e se vingar... se alguém souber entender isso, vai alcançar o que estou dizendo.
Não quero que todos saiam depois de lerem esse texto ajudando a toda e qualquer pessoa por aí. Sim, nem todas são intencionadas à mudar e muitas se aproveitam da caridade e da boa vontade alheia. Mas, sim, poderíamos começar por estender uma mão à nós mesmos e mudarmos um pouquinho nosso senso crítico de direção. A culpa por existirem pessoas assim é de uma sociedade que se perdeu. Não se sabe ao certo aonde e nem porque. Pois quanto mais conhecimento se tem, mais afundamos na nossa própria lama. Não tem primeiro nem último culpado. Todos têm sua parcela de culpa nessa triste trajetória, nem que seja a indiferença. Tapar o sol com a peneira também seria uma expressão muito boa para se aplicar aqui. Só resolve agir quando o calo aperta no pé! De repente, aí já será muito tarde... para salvar a vida de uns e a nossa consciência!
Parabéns a esse programa que consegue trazer para dentro de nossas casas um pouquinho da realidade que sabemos existir, mas não vemos para ver a novela das 9h cheia de belas paisagens, casas luxuosas e gente bonita. Os próprios repórteres demonstram sensações, sentimentos muitas vezes desconfortáveis, um aprendizado, ficam tocados. Nota-se no tom de voz, no olhar, nos relatos... e isso aí, vale a reportagem toda. Quem é jornalista sabe que muitas vezes o resultado da matéria está em quem a escreve e não em quem a vê. Por isso a mensagem chega limpa aos receptores, sem interpretações erradas!
Enfim... e isso!
Pensem: ainda dá tempo...
Um comentário:
Eu adoro esse programa, um dos melhores de reportagem, senão o melhor.
E gravei esse aí e vou ver ainda, tenho certeza que vou me chocar, porque reportagens, filmes e outras coisas que falem de drogas sempre mexem comigo, pois passei por isso e sei o quanto aquilo é o inferno na Terra.
Beijocas
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