Quarta à noite, véspera de feriado, me pus à frente da tv e vi um filme que como dizia minha avó, a capa é bonita, mas vamos ver o conteúdo. Fui comprada por uma mensagem subliminar, na verdade. Me identifiquei com uma mensagem passada no trailler e que eu vesti a carapuça. E quando comecei a assistir, de fato constatei que não tinha me enganado.
É certo que não vou entrar em pormenores, nem relatar o final, mas como
geralmente o que me cativa em qualquer história é o lado humano, é nele
que vou focar. O filme conta a história de um agricultor, ex piloto de testes da NASA,
viúvo, pai de dois filhos, que se vê num dilema: aceitar embarcar numa
missão espacial ou não. O maior desafio, porém, está na passagem do
tempo. Enquanto para os filhos o tempo transcorrerá normal, hora após
hora, ano após ano... para o pai, no espaço, o tempo transcorrerá mais
devagar, no compasso de alguns minutos. Num dos momentos,
durante a visita a um planeta fictício, os astronautas se atrasam alguns
minutos, e com isso perdem vinte e quatro anos no tempo da Terra. Para o
pai, tempo precioso ao perceber que perdeu a infância dos filhos. Enquanto o filho mais velho envelhece diante da tela do computador,
enviando mensagens periódicas ao pai, a filha mais nova, ressentida da
partida de seu grande herói, se recusa a enviar mensagens. Até o dia em
que percebe que ela e o pai estão muito mais ligados do que poderiam
supôr.
Enfim, entre suspense e lágrimas, reconheci um pouquinho de minha
humanidade ali. E por isso me comovi diante da história do pai que perde
a linha condutora da vida de seus filhos. De afetos que se perdem pelo
caminho, como se o tempo corresse diferente para cada um.
Sempre imaginamos que teremos mais tempo. Que podemos deixar para
depois certas ações, que elas se concretizarão naturalmente, dentro do
nosso tempo. Porém, nem sempre o nosso tempo é o tempo que está
reservado para nós. E é muita pretensão acreditar que podemos prorrogar
nossos passos ou adiantar nossos desejos só porque acreditamos que
domamos os relógios da vida e dos acontecimentos.
Cooper, personagem central de Interestelar, acreditava que ainda teria
tempo de sair em missão e voltar para seus filhos. Acreditava que ainda
poderia acompanhar a infância de seus meninos e ser um bom pai. Porém,
não é o que acontece ( não, eu não estou contando o final do filme).
Infelizmente, para eles é tarde demais.
É devastador descobrir que chegamos tarde demais. Que deixamos pra
depois o que nunca mais poderá ser realizado. Que adiamos nossas vidas
em busca do momento perfeito ou da hora ideal, sem perceber que a vida
acontecia no aqui e agora; sem se dar conta que o presente era precioso
demais para simplesmente ter sido adiado pra depois.
Tanta coisa vem na frente, colocamos como prioridade como o dia-a-dia atribulado, as tarefas que se acumulam, as contas a pagar,
os filhos para cuidar, o trabalho para não atrasar, a limpeza da casa e a
alimentação que não pode faltar, os amigos para dar atenção, o marido
ou a esposa para agradar, tudo que consome nossa energia, muitas vezes
não deixam espaço para resolver aquela questão pendente, aquele problema
aparentemente sem solução, aquela mágoa no coração, aquele sonho não concretizado... Quando na verdade a solução dos problemas está bem pertinhos de nós, basta despertar.
Querendo ou não, tudo gira em torno de uma balança. E definir nossas
prioridades ou escolhas se torna essencial para decidir aquilo que não
queremos deixar para trás ou chegar atrasados demais. Inconcebível seria
chegar tarde para a infância dos filhos, para o relacionamento de
nossas vidas, para as chances improrrogáveis ou momentos perfeitos que
ditarão a eternidade.
Interestelar recusa a morte como recusa o fim de um tempo. Cooper,
desejando salvar seus filhos _ e a humanidade _ do apocalipse que se
aproxima, oferece-se para a missão _ a última chance de fazer aquilo que
para ele é sua verdadeira vocação. Porém, ao perceber a velocidade com
que o tempo passa para aqueles que ama, arrepende-se da empreitada e
descobre que fez a escolha errada. Quer voltar, pois de nada adianta o
tempo não passar para ele, se passa e leva embora aqueles que ama.
Assim, não há remédio que cure a morte de um tempo. Podemos brincar de
faz de conta, mas ainda assim, temos que nos adaptar e ajustar ao que
resta de nós apesar das perdas e despedidas inerentes a qualquer vida.
Interestelar é uma ficção que brinca com a ciência, mas acima de tudo
fala de amor. Do sentimento que ainda move o homem e conduz suas ações.
Do que motiva alguém a buscar a escuridão _ o buraco negro _ para
trazer luz à sua família.
Recusamos a morte e queremos que o amor nos salve da vida. Buscamos a
escuridão desejando que ela nos traga alguma luz. Desafiamos o tempo
almejando desperdiçá-lo e guardá-lo no mesmo instante; corremos riscos
para nos sentirmos seguros; nos perdemos para nos encontrarmos.
Percebemos enfim que o triunfo da vida está no amor, nem sempre claro,
nem sempre explícito, mas ainda assim, real.
Fui reconfortada por uma parte de mim ter sido acolhida por essa lição. Uma parte de mim que se ressente das perdas, do que o
tempo levou e não traz mais, das ausências, dos hiatos que se
consolidaram com a distância. Porém, ainda acreditando no amor. Nessa
força poderosa que nos torna homens. Que nos torna simplesmente e
poderosamente... humanos.
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